INSTITUCIONAL

41ª Feira do Livro do Colégio Miguel de Cervantes

Espelhos e narrativas: (des)encontros de culturas na Literatura

Por: Tatiana Maria de Paula Silva | 20 de maio de 2025.

Entre os dias 15 e 17 de maio, o Colégio Miguel de Cervantes realizou a 41ª edição da sua tradicional Feira do Livro. Com o tema “Espelhos e narrativas: (des)encontros de culturas na Literatura”, o evento deste ano propôs uma reflexão crítica sobre a representação do negro e dos povos originários nas produções literárias, especialmente nas literaturas hispânica, inglesa, norte-americana e brasileira.

Partindo da ideia de que a literatura pode ser tanto espelho quanto lente — refletindo culturas, histórias e identidades, ao mesmo tempo em que revela silêncios e distorções —, a programação da feira promoveu o diálogo sobre a importância da representatividade e do reconhecimento de narrativas historicamente apagadas.

A proposta foi abrir espaço para diferentes vozes e olhares, valorizando obras que contribuem para a construção de uma visão mais plural, diversa e crítica do mundo. Ao longo dos três dias, alunos, professores, autores e convidados participaram de atividades que envolveram leitura, escuta, criação artística e trocas significativas em torno da literatura como instrumento de transformação.

15 de maio

Logo no início do dia, as turmas do 1º ano do Ensino Fundamental I foram ao teatro para um momento especial com a atriz e escritora Nina Brondi. Por meio da contação da história Escola de Chuva, Nina envolveu os pequenos com palavras e imagens encantadoras.

Simultaneamente, no auditório, os alunos do 2º ano do Ensino Médio participaram de uma videoconferência com a professora e pesquisadora Constância Duarte sobre a obra de Nísia de Floresta, Opúsculo Humanitário. Nísia foi a primeira autora do país a publicar textos em defesa dos direitos das mulheres e da igualdade de gênero. A obra serviu como ponto de partida para um debate sobre direitos humanos, justiça social e empatia.

Na sequência, o teatro foi palco da abertura oficial com a conferência “A Literatura Indígena: conhecendo outros Brasís”, conduzida pela poetisa e pesquisadora Trudruá Makuxi, nascida como Julie Dorrico. Integrante do povo Macuxi e doutora em Teoria da Literatura, Trudruá compartilhou sua trajetória como escritora e ativista indígena, destacando a importância da reconexão com suas raízes, do resgate da memória ancestral e do reconhecimento da diversidade identitária brasileira. A abertura contou ainda com uma intervenção musical e com momentos de interação em que o público aprendeu saudações na língua macuxi. A atividade sensibilizou os alunos do Ensino Médio sobre os desafios enfrentados pelos povos indígenas no Brasil contemporâneo e promoveu discussões sobre temas como territorialidade e religiosidade.

A programação da tarde teve início com os pequenos da Educação Infantil. As turmas do Infantil 4 participaram da contação da história Redondeza, conduzida por Nayabe Rodrigues. Em seguida, foi a vez dos alunos do Infantil 3 vivenciarem um momento de encantamento com a contação, realizada por Nayabe Rodrigues e Gabriel Xavier, da obra A Sopa Está Pronta!, de Susanne Strasser. A atividade envolveu as crianças em uma narrativa interativa e divertida, na qual ajudavam a cozinheira a lembrar dos ingredientes da sopa e dos animais que surgiam pelo caminho.

Enquanto isso, no auditório, os alunos do 2º ano do Programa do Diploma e do 3º ano do Ensino Médio participaram da mesa-redonda “Traduttore, traditore: labirintos da tradução”. Com mediação dos professores Fábio Brazolin, Paula Renata e Giovani Rodrigues Silva, o encontro debateu os desafios e dilemas do trabalho de tradução literária. Paula Renata discutiu as escolhas envolvidas na tradução de Dom Quixote, a qual buscou equilibrar fidelidade à linguagem original e acessibilidade ao leitor contemporâneo. Giovani Silva abordou a tradução de A Metamorfose, de Kafka, destacando a necessidade de preservar o ritmo e o humor do texto. Já Fábio Brazolin falou sobre as complexidades de traduzir a poesia russa, explorando a musicalidade e a intenção do autor. A atividade provocou reflexões instigantes sobre o papel do tradutor como mediador entre culturas e linguagens.

Encerrando o dia, o rapper e produtor musical Xis participou de um encontro memorável com os alunos do 1º ano do Ensino Médio. A atividade fez parte do projeto “XIS: raízes e frutos do Hip Hop brasileiro” e foi articulada com a obra A Árvore da Música Brasileira, organizada pela pesquisadora Elisa Mori e pelo músico Guga Stroeter. Durante a conversa, Xis compartilhou sua trajetória no rap nacional, iniciada nos anos 90 com o grupo DMN, e falou sobre a importância da literatura, da leitura e da cultura na formação do artista e do cidadão. O ponto alto do encontro foi a participação dos alunos, que apresentaram raps e videoclipes autorais, muitos deles inspirados nas músicas do próprio Xis. Um momento de celebração da criatividade, da identidade e da força transformadora da arte.

 

16 de maio

O segundo dia da Feira do Livro foi marcado por encontros inspiradores, diálogos e atividades que conectaram literatura, identidade, memória e representatividade.

Logo pela manhã, os alunos do 2º ano do Ensino Fundamental participaram de um encontro com as autoras Edna Ande e Sueli Lemos, responsáveis pela obra Siara descobre a África gráfica. A atividade iniciou-se com uma apresentação musical feita pelos próprios alunos, que celebraram os cantos e danças presentes na narrativa do livro. A conversa abordou a importância da ancestralidade, da tradição artística do povo Ndebele e da construção dos personagens, despertando o interesse das crianças por temas como identidade cultural, herança africana e pertencimento. As autoras também visitaram a exposição com os trabalhos produzidos pelas turmas a partir da leitura da obra.

No auditório, os alunos do 2º ano do Ensino Médio participaram de uma conversa sobre o clássico contemporâneo O Conto da Aia, de Margaret Atwood. A atividade, conduzida pelos professores Fábio Abdulmassih (Literatura) e Aline Bonezzi (Inglês), trouxe à tona discussões sobre autoritarismo, opressão e direitos das mulheres.

Os alunos do 7º ano do Ensino Fundamental II tiveram a oportunidade de conhecer a autora e arquiteta Marília Marz. Criadora da História em Quadrinhos Indivisível, Marília apresentou sua trajetória, suas inspirações e o processo criativo por trás da obra. A partir da história do bairro da Liberdade, em São Paulo, a autora tratou de temas como apagamento histórico, identidade cultural e pertencimento.

Enquanto isso, no auditório, os alunos do 3º ano do Ensino Médio participaram de uma videoconferência com o poeta espanhol Victor Peña, autor da Antología poética: Destellos de calidad (2014–2024). Durante o encontro, o escritor compartilhou aspectos de sua trajetória, recitou poemas e dialogou com os estudantes sobre seu processo criativo na poesia contemporânea. A atividade integrou a disciplina de Literatura Espanhola e aprofundou o contato dos alunos com a produção literária do autor estudado em sala de aula.

O teatro foi palco de mais uma vivência com a fotógrafa e pesquisadora Larissa Isis, idealizadora do Projeto Cansei. Recebida com a emocionante interpretação de O Canto das Três Raças, apresentada por professores e alunos do 8º ano, Larissa compartilhou sua trajetória e apresentou o projeto que transforma a fotografia em uma ferramenta de denúncia contra o racismo estrutural. A atividade envolveu os alunos do 1º ano do Ensino Médio e do 2º ano do Programa do Diploma e foi antecedida por estudos em sala de aula sobre textos de Djamila Ribeiro e pelas imagens do próprio projeto.

Os alunos do 4º ano do Ensino Fundamental participaram de uma oficina cultural sobre turbantes africanos, conduzida pela jornalista e artesã Penha Crispim. Inspirada no livro A Menina que Queria Rodar a Baiana, de Tiago Freitas, a atividade trouxe à tona o simbolismo dos turbantes como expressão de ancestralidade, identidade e resistência. Os alunos aprenderam sobre a origem histórica desses adereços e puderam experimentar diferentes formas de amarração, fortalecendo o sentimento de pertencimento e orgulho cultural. A oficina foi uma celebração da cultura afro-brasileira e um momento de valorização da diversidade.

17 de maio

Um sábado de encontros transformadores

O terceiro dia da 41ª Feira do Livro do Colégio Miguel de Cervantes foi um verdadeiro festival de literatura, arte e cultura, envolveu todos os segmentos escolares e encantou também o público visitante. A programação incluiu espaços de convivência, exposições imersivas e intervenções emocionantes que tomaram conta da escola ao longo do dia. Houve apresentações musicais da Educação Infantil e do 1º ano do Ensino Fundamental, contação de histórias, leitura de cordel, oficina de samba, estande de autógrafos e uma oferta diversificada de comidas na praça de alimentação. As exposições dos trabalhos dos alunos completaram o cenário vibrante e acolhedor deste encerramento.

Os alunos do 4º ano do Ensino Fundamental I participaram de um encontro inspirador com Tiago Freitas, autor de A menina que queria rodar a baiana, no auditório. Ao lado das baianas Bah e Laura, que inspiraram sua obra, Tiago falou sobre ancestralidade e memória cultural. A conversa culminou em um vibrante desfile, produzido pelos próprios alunos, da Escola de Samba Unidos do Cervantes, celebrando a cultura afro-brasileira com muito samba e alegria.

Em seguida, Daniel Munduruku conduziu uma experiência tocante com os alunos do 3º ano, compartilhando saberes de sua etnia por meio do livro Um dia na aldeia, que revela o cotidiano das crianças Munduruku e sua relação harmônica com a natureza. Mais tarde, Munduruku também esteve com os pequenos do Infantil 4 para falar sobre Redondeza, uma obra que proporciona uma imersão no universo das infâncias indígenas.

No teatro, os alunos do 6º e 7º ano participaram de um bate-papo com os quadrinistas Rafael Calça e Jefferson Costa sobre a HQ Jeremias: Alma. Durante o encontro, os autores abordaram temas como identidade, ancestralidade e racismo. Durante o último trimestre a obra foi base para projetos interdisciplinares que integraram literatura, espanhol, matemática e produções artísticas. A participação dos alunos do Cervantes Solidário, que prestaram uma emocionante homenagem aos autores, destacou o momento de escuta, arte e reflexão crítica.

Os alunos do 8º ano se encontraram com a autora Lucia Seixas, que, ao falar sobre sua obra Vórtex, discutiu sobre utopias, literatura e desafios da escrita no mundo digital contemporâneo. Já Marcelo Duarte também esteve presente, conversando sobre Detetive Vaga-Lume e o misterioso caso do Escaravelho, um livro que homenageia a clássica série juvenil dos anos 70 — Coleção Vaga-Lume —, criando um ambiente de nostalgia e entusiasmo, com até pais e mães de alunos relembrando a coleção original.

Os alunos do 9º ano participaram de um encontro com João Anzanelo Carrascoza, autor de Aquela água toda, que com uma fala poética e afetiva destacou a importância de perceber a beleza nos pequenos momentos da vida. Em seguida, Maicon Tenfen conversou sobre Quissama: o império dos capoeiras, uma obra que mistura história e ficção, levando os leitores a refletirem sobre o passado escravocrata e o valor cultural da capoeira, promovendo um profundo mergulho na história do Brasil e suas narrativas.

No auditório, os alunos do 1º ano do Ensino Médio participaram de uma conversa com Kaled Kanbour, autor da HQ Província Negra, que reconstrói a trajetória de Luiz Gama na São Paulo do século XIX. O encontro provocou uma reflexão sobre os silêncios da história e o papel da arte como resistência. Os alunos do 2º ano assistiram a uma palestra de Débora Tavares sobre 1984, de George Orwell, destacando a atualidade da distopia ao abordar temas como poder, vigilância e liberdade e a importância da literatura na formação crítica. Também no auditório a historiadora Cristina Wissenbach encontrou-se com os alunos do 2º ano e palestrou sobre a HQ Mukanda Tiodora, de Marcelo D’Salete, destacando a resistência negra e a luta por liberdade na cidade São Paulo do século XIX.

Para encerrar a programação, Vera Eunice de Jesus Lima, filha de Carolina Maria de Jesus e o pesquisador Ubiratã Souza conduziram uma conversa profunda sobre Quarto de Despejo, abordando o legado de Carolina Maria de Jesus e o impacto da marginalização urbana nas populações negras. Este encontro foi marcado por escuta sensível, emoção e memória viva.

Além da programação literária, o público teve a oportunidade de aproveitar a exposição imersiva do livro Origem, de Nat Cardozo, montada no foyer do teatro.

Nos estandes de autógrafos, tivemos momentos especiais e a honra de receber autores incríveis:

Ana Beatriz Chamat com Abra a caixa
André Hirst com O menino que não amarrava a chuteira
Angeles Paredes com Capim, o cavalinho verde
Débora Ferrari com E agora, Pedrinho?
Elisabete Ribeiro com O mistério da borboletinha
Giovane Rodrigues Silva com As investigações filosóficas e Sobre a certeza
Ivo Bonfiglioli com Dois estranhos numa orquestra
Luis Gustavo Reis com A trajetória de Joaquim Pinto de Oliveira, o Tebas
Moreira de Acopiara com Mulheres negras inspiradoras
Paula Renata de Araújo e Silvia Massimini Feliz tradutoras de Dom Quixote
Priscila de Brito com Sintonizados
Suppa com Vida de rainha

O sábado, 17 de maio, foi um verdadeiro mosaico de vozes, histórias, ritmos e saberes, um dia em que a literatura, que já é parte integrante do cotidiano do Colégio, atravessou mais uma vez os muros da escola para reafirmar seu poder de sensibilizar, educar e transformar. Seja nas leituras obrigatórias, nas indicações dos professores, nas leituras espontâneas motivadas pelas visitas à biblioteca ou nos projetos diversos, a literatura sempre foi, e continua sendo, um dos pilares essenciais da formação de nossos alunos.

 

 

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